2.10.07

O Sistema Nacional de Saúde



Alguma imprensa de hoje dá relevo ao mau desempenho do nosso sistema de saúde no ranking europeu. Esta apreciação parte da análise de diversos parâmetros, mais ou menos favoráveis para os utentes, num contexto de 29 países avaliados.

Nada disto nos surpreende. O sistema nacional de saúde está seguramente no topo das queixas dos portugueses. O tempo de espera nos serviços públicos é globalmente desesperante; as consultas de especialidade e as cirurgias são uma miragem; as empresas prestadoras de exames complementares de diagnóstico aos utentes do SNS, incentivam-nos, com prazos muito aliciantes, a recorrem particularmente a estes serviços. Esta oferta é fornecida paralelamente por essas mesmas empresas, como uma opção bem mais rápida mas significativamente mais onerosa para os utentes.

O Orçamento do Estado para 2007 contém uma norma que determina que o preço das convenções desce em função do aumento da procura. Ou seja, quanto mais exames fizerem, menos os prestadores privados receberão do Estado. Isto explica muito do que vimos assistindo no desmembramento do serviço nacional de saúde. Nem universal, nem tendencialmente gratuito.

MFQ



8 comentários:

João Fialho disse...

Caro Manuel Filipe.

Sei que este tema lhe é muito caro. Compreendo-o. E é fácil ver que tem alguma razão na sua apreciação.

Mas já estamos todos (?) a perceber que o futuro do SNS não se afigura risonho. Por uma questão de políticas de saúde, essencialmente ao nível do financiamento, mas também porque se transformou ao longo dos anos numa espécie de sugadouro dos dinheiros do Orçamento de Estado.

Como está, não acredito que o SNS tenha futuro. Claro que o contrário seria bom, mas não acredito. Aos poucos, os governos irão cada vez mais, sempre que puderem, a transferir o financiamento de parte substancial das despesas de saúde para os próprios utentes.

Universal, vai sempre ser, por uma questão de conceito, que não de prática. Tendencialmente gratuito, penso que é apenas um aforismo que se irá transformando em utopia. Sê-lo-á cada vez menos.

Anónimo disse...

Portugal ocupa o 19º.lugar no ranking da saúde dos 29 países da Europa, o que não sendo um lugar muito prestigiante, não envergonha de todo; se atentarmos, por um lado, que em determinados sectores específicos de avaliação, como por exemplo a mortalidade infantil, ocupamos lugares mais lisonjeiros e que, por outro, se têm verificado índices de recuperação bastante favoráveis em sectores mais críticos, é caso para encararmos com algum optimismo, mais do que o estado actual, o evoluir favorável do panorama da saúde em Portugal.

Não será, eventualmente, com este ministro, com este governo, com as políticas, de A a Z, que estão a ser implementadas actualmente, mas estou em crer que daqui a 5 anos estaremos em Portugal muito melhor do que estamos hoje na área da saúde; é a esta evolução, à parte do lugar que se ocupa no ranking num dado momento, que é preciso estarmos atentos.

Sempre é melhor progredir do que regredir, seja ele qual seja o ranking; mais importante do que o lugar que ocupamos será a sempre melhor qualidade do serviço que nos é prestado, e se um dia ocuparmos o 29º. lugar em igualdade com o 1º., será excelente!

MFQ disse...

Caro Marco António

Gostaria de poder partilhar o seu optimismo mas infelizmente não é isso que os utentes do SNS sentem no dia a dia. Estamos a avaliar sectores diferentes de actuação. Muito concretamente, eu estou a pensar nos que não podem recorrer aos subsistemas de saúde nem podem pagar consultas, cirurgias de especialidade e exames complementares de diagnóstico. E é o próprio estado, com a sua política de contenção, que incentiva os prestadores destes serviços a “dificultarem” o seu acesso aos utentes dos SNS, encaminhando-os para as alternativas privadas que funcionam paralelamente nos mesmos serviços.

No caso específico de determinados exames complementares de diagnóstico, assistimos a um retrocesso brutal no acesso a esses serviços. No nosso círculo geográfico, compreendendo Évora e Setúbal, há exames cuja marcação pelo SNS é impossível. Nestes casos são os próprios prestadores que incentivam os utentes a pagar os 90 ou 100 euros para prestarem o mesmo serviço. Não posso de forma alguma concordar com este princípio.

Um abraço

MFQ

MFQ disse...

Corrijo:

… estou a pensar nos que não podem recorrer aos subsistemas de saúde, nem podem pagar consultas de especialidade, cirurgias ou exames complementares de diagnóstico.

MFQ

Anónimo disse...

Meu Caro Manuel Filipe,

Já tive oportunidade de constatar, por mais de uma vez, que o tema da “Saúde” lhe é particularmente grato, deformação profissional, no bom sentido, seguramente, tema do qual tem dado sobejas provas de dominar com grande à vontade.

O meu comentário anterior focalizou-se, exclusivamente, no ranking a que o meu amigo fez referência e, objectivamente, o que eu pretendi dizer foi o seguinte:

- 19º. lugar num ranking de 29, não sendo bom, não deslustra completamente; perguntar-se-á em que outras áreas, da economia à social, passando pela do trabalho, pela dos rendimentos “per capita”, pela formação académica ou profissional, qual delas é que poderemos estar acima do 19º. lugar num universo dos 29 países europeus?

- O segundo aspecto que me parece importante, a que tive oportunidade de me referir, não tem tanto a ver com o posicionamento específico num dado momento mas, sobretudo, com o processo de evolução qualitativa que, eventualmente, se tenha registado; com alguns avanços e recuos, e muitas vezes é preciso recuar um pouco para poder avançar mais, é minha convicção de que o panorama da saúde, em geral, e tendo presente toda a dimensão do território português, Vendas Novas é apenas um pequeno concelho e que, infelizmente, pode constituir uma excepção à regra, está bastante melhor do que há alguns anos atrás.

Quando o meu amigo, no seu último comentário e com a devida ressalva que lhe fez, escreve ”Estou a pensar nos que não podem recorrer aos subsistemas de saúde, nem podem pagar consultas de especialidade, cirurgias ou exames complementares de diagnóstico”, bom eu só lhe posso dizer que lamento profundamente a situação de toda essa gente e que considero inconcebível que num país onde se gasta tanto dinheiro em obras de fachada e de retorno mais do que duvidoso, das autarquias ao governo da nação, não haja mais dinheiro para um sector tão importante como o da saúde de modo a proporcionar a todos os utentes, não só aos mais necessitados economicamente, um serviço de qualidade.

Se faço referência a este aspecto é porque se no plano social, e bem, há que dar condições às classes mais desprotegidas, no plano dos direitos dos cidadãos acaba por se tornar absolutamente injusto para aqueles que mais impostos pagam ao Estado, fruto dos seus salários e/ou rendimentos - o imposto profissional atinge, como sabe, um escalão acima dos 40% -, e que acabam por ser, exactamente, aqueles que menos beneficiam do sistema, para não dizer que, por razões óbvias, se auto-excluem.

A pergunta que se coloca é a seguinte:

- O que seria do SNS, que já é deficitário para os seus utentes habituais, se todos aqueles que a ele têm direito repito, a ele têm direito, e refiro-me naturalmente às classes mais protegidas e que são aquelas que mais impostos pagam ao Estado, ou se me permite utilizar o seu texto, com uma ligeira adulteração, “aqueles que nunca recorrerem ao SNS e que apesar dos avultados impostos que pagam ao Estado, se vêem obrigados a recorrer a consultas de especialidade, cirurgias ou exames complementares de diagnóstico”?

Devia ser interessante, apenas por uma semana, fecharem todos os subsistemas de saúde que não têm acordos com o SNS, hospitais, clínicas, centros de enfermagem, laboratórios, centros de radiologia, etc., e ver os milhares de “protegidos” que embora tendo pleno direito ao SNS mas que, tradicionalmente, recorrem àqueles subsistemas, em fila à porta, e digo à porta porque duvido que lá coubessem dentro, dos serviços públicos de saúde…

Ainda bem que há cidadãos no nosso país que podem, ou têm essa regalia profissional, recorrer aos subsistemas, porque senão seria o caos!

Um abraço

(Nota: De algum modo também eu tenho alguma paixão por este tema da saúde, paixão que me advém por “via genital” já que sou casado, há 33 anos, com uma enfermeira…)

MFQ disse...

Caro Marco António

Agradeço-lhe a disponibilidade e a elevação que vem demonstrando nos seus comentários, sempre pertinentes e muito bem elaborados.

Constato que no essencial defendemos a mesma dama. Os subsistemas são essenciais, é ponto assente, nunca advoguei a sua fragilização e muito menos o seu termo.

Não me escandaliza o défice do SNS, ainda que suportado pelos meus (nossos) impostos. Aceito que o governo se empenhe numa redução moderada e criteriosa desse mesmo défice, já não concordo que o faça à custa de bloqueios sucessivos, ou que feche os olhos (e de alguma forma incentive) a falta de alternativas de acesso aos serviços de saúde por parte de uma larga faixa de cidadãos.

Um abraço

MFQ

bordadagua disse...

Pois é cá no meu Almanaque o nosso Portugal está atrasado 30 anos em relação ao que se passa nos países mais evoluídos.Eu disse na ordem dos 30 anos.

E o mais triste da questão é ver países que há 10 anos estavam atras de nós já nos ultrapassaram.

A culpa é de todos nós.

João Fialho disse...

Minha e sua também? Porquê?